quinta-feira, 28 de outubro de 2010

Só sei fazer isso

Eu nunca fui boa em nada.
Não sei jogar futebol, vôlei, nem basquete.
Não sei calcular logaritmo nem pH.
Não sei cantar, dançar, nem contar piada.
Nunca fui das palhaças e desbocadas.
Não falo o que penso, sem pensar.
Não sei desenhar.
Não sei brigar, nem ofender.
A única coisa que eu sei fazer é sentir.
Tem vez que sinto até demais.
Sinto tanto que dói.
Dói de raiva, dói de amor.
Dói de dó e de saudade.
Dói de não entender ou não saber.
Dói de tentar e não chegar.
É tanta dor que eu finjo que dói.
Dói de ter e de não ter.
Dói por querer e por não poder.
Dói que sinto latejar.
Dói que preciso escrever, preciso contar.
Sinto tanto que não consigo escrever pouco.
Só sei sentir e escrever. E vice-versa.

quarta-feira, 27 de outubro de 2010

A via

O que me mata é essa coisa de eu te dar todo o meu amor, todo mesmo - tanto amor que chega a doer - e não receber (quase) nada. Eu pareço um cachorro quando você encosta em mim, fico boba, feliz, satisfeita. Me sinto amada. E você sequer percebe. Não é possível que não nota essa via de duas-mãos que somos, aonde tem muita mais movimento na mão que vai de mim até você. É desigual, desproporcional, descompassado. Não te cobro, não te falo, não te castigo. E nem é por falta de tentativas ou de curiosidade para ver se você sentiria falta, é porque eu não consigo. Não consigo ficar longe. Não consigo me preocupar menos. Não consigo não falar com você, não perguntar nem saber. Não consigo ficar brava. Não consigo. E por isso já desisti de tentar, porque eu sei que passa rápido e que tudo volta ao que é o nosso normal. A via de duas mãos, com uma mais movimentada que a outra. Mas alguém precisa cuidar mais e o outro ser cuidado. Um amar e o outro ser mais amado. E assim vamos...

terça-feira, 19 de outubro de 2010

Filmagem

Decidi sair de casa, era uma noite de inverno, precisava de um pouco de ar, queria ir pra bem longe, mas não podia sair dali. Não me deixaram ir, era tarde, perigoso. Seria melhor ter ido mesmo assim, sem que ninguém percebesse, pois não teria visto você na televisão. Não seria obrigado a ver você feliz com ele, passeando no parque, atrás das filmagens que fizeram pro jornal.
Tanto tempo te evitando, evitando todos os lugares que fomos juntos. Todos os programas, músicas, cheiros e gostos. Tudo pra não lembrar de você. E naquele dia, percebi que todos os meus sacrifícios tinham sido inúteis. Vocês apareceram por três segundos, mas eu vi. De mãos dadas, felizes. Foi o bastante.
O que eu fiz? Entendi que te perdi. Mas eu ainda tinha que me salvar.
Decidi sair de casa. Ia embora, por quanto tempo eu pudesse, ia mudar de país, ficar longe. Os bairros entre os nossos não eram mais suficientes.

Quilômetros.
Países.
Culturas.

Eu tenho que ir. Agora é a minha vez de aparecer feliz no fundo da filmagem...

domingo, 10 de outubro de 2010

Decepção

Pro dicionário:
De.cep.ção
sf (lat deceptione) 1 Ação de enganar. 2 Surpresa desagradável. 3 Desilusão. 4 Logro.

Pra mim:
1 Você.

quarta-feira, 6 de outubro de 2010

Angela

Eu sabia que a vontade dela não era estar comigo. E isso me machucava mais do que a ideia de não a ter por perto. Preferia me conformar pela separação, do que olhá-la e ter a certeza de que seus pensamentos, desejos e planos não eram pra mim. Não eram comigo.
Angela tentava me amar, eu sabia que sim, sentia isso. Talvez não por mim, mas por ela mesma. Ela tentava e não conseguia, não me sentia amado, apesar de seus esforços. E ela não tinha culpa. Tudo passa, mas ela não acreditava nisso, não aceitava. Acreditava que o nosso amor era eterno, imutável, indiminuto, resistível a tudo. Esqueceu-se do tempo. O tempo muda tudo e todos, os gostos, humores, pessoas, relações, sofrimentos e também os amores. E isso a fazia infeliz.
Angela tentava ser o anjo do seu nome, mas não era essa sua sina, tinha nascido para viver aventuras, emoções e eu não lhe proporcionava isso. Sempre soube, mas tinha medo de falar e ela me abandonar. Fui medrosa e egoísta. Carente. Agora sei que o melhor seria ter dito e evitado a dor de alguém tentando me amar sem conseguir.
A dor de terminar com ela foi grande, mas menor do que a eu sentia ao seu lado. Eu a amava. Eu a amo. Mas aquilo, que tinha sido um grande e verdadeiro amor, já não existia mais. Era o meu amor com a minha dor. A compaixão dela com a lembrança do amor que sentiu por mim. Disso ninguém sobrevive.

sexta-feira, 1 de outubro de 2010

Mais um...

Pra variar mais um encontro sem querer. Era uma tarde e nós estávamos num clube, assistindo a algum jogo bobo, de outras pessoas que foram curtir o domingo de sol também. De repente ouço você me chamando. O coração dispara, o sorriso não pode ser escondido, e nem quer.
Assistimos ao jogo juntos, conversando, rindo. Eu num degrau acima de você, mexendo no seu cabelo. Você apoiado nas minhas pernas, parecia confortável. Mas do nada você se virou pra trás e eu me assustei. Mas então só fechei os olhos. Aquele beijo foi o melhor da minha vida. O mais esperado e o mais inesperado.
Saímos de lá abraçados, de mãos dadas, não queríamos nos separar. Não falávamos mais, nem precisava, tava tudo certo. Estava perfeito daquele jeito. Compramos balas e demos às crianças. Demos a volta no lago, nos sentamos na beira e ficamos ali, olhando para as flores, ouvindo o canto dos pássaros.

Foi lindo, tão lindo que eu acordei.